Dispositivos médicos na América Latina: oportunidades após a crise

Este é o primeiro artigo de uma série intitulada Aprendizados da Pandemia, que apresenta um apanhado dos eventos e mudanças que nos impactaram nesses últimos dois anos. A crise sanitária e suas consequências econômicas, o impacto social, novas formas de trabalho, a virtualidade e novas formas de atenção médica são alguns dos principais temas que abordaremos nesta série.

Esta primeira edição traz duas questões presentes durante toda a pandemia: a crise do sistema de saúde e as oportunidades que surgiram em meio ao cenário turbulento.

LIÇÃO N°1: Para ter um sistema de saúde robusto no longo prazo, o foco deve residir no diagnóstico preventivo e em uma atenção primária estratégica.

A chegada da pandemia demonstrou que os sistemas de saúde não estavam preparados para enfrentar uma crise sanitária. Os países mais desenvolvidos ou com maior capacidade de resposta, seja econômica ou tecnológica, conseguiram se recuperar com relativa rapidez, mas ainda assim reconsideraram sua estratégia de atenção e investimento em saúde, concentrando seus esforços no desenvolvimento de sistemas de atenção primária com campanhas de prevenção e conscientização, no replanejamento do sistema de saúde público e privado e no diagnóstico preventivo. A América Latina sofreu grandes perdas humanas e econômicas por falta de investimentos e essa questão ficou evidente, razão pela qual foi incorporada às agendas governamentais e até empresariais.

Nesse sentido, por meio do seu banco de dados HospiScope, a GHI revelou dados muito interessantes que confirmam que o número total de leitos na América Latina cresceu 2,2% por ano em 2020 e 2021, chegando a quase 1 milhão de leitos em toda a região. Os leitos ambulatorias registraram crescimento anual de 5,7% em 2020 e 2021, enquanto os leitos intensivos aumentaram 16,4% na mesma base de comparação, chegando a 90 mil unidades regionais. Em relação aos leitos cirúrgicos, o crescimento anual em 2020 e 2021 foi de 3,7%.

Da mesma forma, os equipamentos de diagnóstico primário e de diagnóstico avançado por imagem também apresentaram um crescimento anual em 2020 e 2021:

Os equipamentos de diagnóstico primário e de diagnóstico avançado por imagem também apresentaram um crescimento anual em 2020 e 2021

Nossos dados mostram que os investimentos se concentraram em aparelhos de diagnóstico por imagem muito mais precisos e que geram resultados mais específicos para a determinação de patologias. Essa é uma indicação de como a indústria mudou e onde estão as oportunidades de crescimento e investimento. A partir dessa constatação, pode-se dizer que, embora o diagnóstico primário seja uma estratégia fundamental para abordar a saúde da população, os hospitais e clínicas têm investido mais em dispositivos de precisão altamente tecnológicos e de custo elevado. O crescimento de ventiladores e do monitoramento de pacientes está diretamente associado às necessidades decorrentes da Covid.

Já constatamos que o diagnóstico preventivo ajuda a lidar melhor com patologias que exigem tratamentos prolongados, minimizando, assim, os procedimentos de emergência. Isso ajuda a concentrar os esforços quando ocorre uma situação de crise, já que os quadros crônicos ficam relativamente controlados. Ao mesmo tempo, a estratégia tem como foco a atenção primária. Sabe-se que os primeiros momentos de atendimento são fundamentais para evitar o agravamento do quadro e, por isso, é fundamental ter um sistema robusto nesse sentido para evitar o avanço de doenças pré-existentes e, acima de tudo, ajudar a reduzir custos e tornar o sistema mais eficiente. Nesse sentido, a pandemia proporcionou um grande aprendizado e uma tremenda oportunidade para o desenvolvimento da telemedicina (TM) como uma poderosa ferramenta de atenção primária. A GHI revelou dados muito interessantes sobre a adoção desse sistema em centros de segundo e terceiro nível. No final de 2021, 15% dos hospitais da região tinham programas de TM, sendo 9% deles “hubs” (os hospitais onde atuam os especialistas), 6% “spokes” (onde ficam os pacientes) e apenas 1% oferece telemedicina internacional. Esses dados mostram claramente que a oportunidade ainda é enorme.

Para concluir, podemos dizer que os grandes aprendizados a este respeito foram a necessidade de:

  • Reforçar a atenção primária à saúde por meio do fortalecimento de estratégias de atendimento como a telemedicina, alcançando mais pessoas de forma mais rápida e eficiente
  • Equipar hospitais e clínicas com leitos para diferentes cuidados (intensivos, intermediários e ambulatoriais), estabelecendo prioridades de atendimento de acordo com as patologias e seus estágios
  • Reforçar os centros de atendimento com equipamentos que permitam diagnósticos rápidos e precisos, trabalhando quase que exclusivamente com diagnóstico e/ou tratamento com equipamentos especializados
  • Planejar estratégias de compra, aquisição de equipamentos e investimento em tecnologia com o objetivo de aproveitar as oportunidades geradas pela pandemia e os avanços no atendimento virtual.

LIÇÃO N°2: Ver a crise como um momento de oportunidades.

A crise gerada pela pandemia trouxe oportunidades para empresas que comercializavam produtos de primeira necessidade ou que conseguiram lançar no mercado produtos necessários ao combate à pandemia, sendo o exemplo mais relevante o PCR em seus diversos modelos, como teste rápido, autoteste e exame laboratorial (os mais conhecidos).

Na maioria dos casos, no entanto, a indústria de dispositivos médicos sofreu uma queda considerável nas vendas de seus produtos e serviços devido à baixa demanda dos chamados procedimentos eletivos, o que os levou a repensar grande parte de seus negócios. Nesse sentido, a ruptura não ocorreu apenas nas formas de fazer negócios – tanto na estratégia como nas vendas de cada mercado –, mas, sobretudo, nos preços.

Para se manter competitivas, muitas empresas repensaram sua estratégia de preços alavancados nas vendas diretas, o que colocou em xeque o papel dos distribuidores, variável de ajuste para a maioria dos negócios que enfrentam uma contração econômica. Os distribuidores são fundamentais e desempenham um papel muito importante para empresas que precisam desenvolver um mercado, lançar um produto em vários lugares ao mesmo tempo e, sobretudo, quando a empresa não tem presença local em mercados com grandes extensões territoriais. Ao mesmo tempo, porém, também são a variável de ajuste quando há uma crise – o que não é nenhuma novidade – e os atores do setor costumam saber que a relação com eles é como um pêndulo.

Em tempos de pandemia, as empresas concentraram o foco em grandes clientes e deixaram de lado negócios que exigem muito esforço para crescer. Isso fez com que compreendessem melhor as necessidades de seus principais clientes e incrementassem o faturamento em meio à crise. A chave é entender que momentos de crise nos impulsionam a gerar mudanças. Nesse caso, terão melhores oportunidades as empresas que alcançarem um equilíbrio ideal para manter relações sólidas com clientes diretos, que se sustentem ao longo do tempo e cresçam sem grandes ou maiores esforços internos, trabalhando de forma colaborativa com distribuidores alinhados às formas de trabalho de cada organização.

Mas a questão é: as oportunidades que surgiram foram aproveitadas da melhor forma? Conseguimos transformar nossos negócios explorando os avanços tecnológicos possibilitados pela digitalização que o mundo experimentou, principalmente de março a outubro de 2020? Em nosso próximo artigo sobre Aprendizados da Pandemia, abordaremos essa e outras questões.

Na GHI, sempre abordamos os temas com uma visão construtiva e a intenção de gerar um debate produtivo. Convidamos você a saber mais sobre as nossas soluções em https://globalhealthintelligence.com/pt-br/solucoes-estrategicas/

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